A cantora, compositora e instrumentista de jazz portuguesa Sara Serpa, radicada nos Estados Unidos, afirmou sentir a responsabilidade “de criar um espaço protetor” para aliviar as pessoas da pressão criada pelas eleições e divisão social.
Há 15 anos nos Estados Unidos, Sara Serpa disse à agência Lusa que este é um dos piores anos que viu no país. A pandemia da covid-19 provocou uma “verdadeira crise de saúde e económica” e “contribuiu para os sentimentos de frustração e negatividade, que depois podem resultar em começar a agredir o próximo”, comportamentos que foram exacerbados nas últimas semanas da campanha eleitoral para as presidenciais de hoje.
“Como artistas, a perspetiva é de como é que a gente pode bloquear e criar um espaço protetor à nossa volta e criar trabalho que possa aliviar as pessoas desta tensão e desta pressão que existe”, indicou.
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“Há muitas forças ‘diabólicas’ para explorar essa vulnerabilidade emocional e psicológica”, considerou a artista, nascida há 41 anos em Lisboa, que tenta distanciar-se dos ecos negativos, da “histeria total nas notícias” e das redes sociais “que amplificam medos e ansiedades”.
A artista, com dez discos lançados, sublinhou estar a tentar “criar uma diferença positiva e não deixar esse discurso destrutivo e divisivo entrar na vida e nas relações”, dando mais valor às “ligações reais” com pessoas ou com a natureza.
Sara Serpa participou na noite de segunda-feira num espetáculo realizado em Brooklyn, em Nova Iorque, com um grupo de músicos de diversas origens e experiências, chamado “Freedom Time”, para a apresentação do novo trabalho do artista norte-americano Darius Jones.
O espetáculo para apresentação do trabalho “We Can Change The Country” não teve público na sala, mas foi transmitido em direto na internet, envolveu música instrumental, vozes, vídeo e luzes e incluiu excertos de discursos políticos, gritos de protesto contra o racismo e incentivos para votar nas eleições.
A composição incluiu memórias recentes da brutalidade policial e da desigualdade social no país, como uma interpretação das últimas palavras do afro-americano George Floyd, morto em 25 de maio durante uma detenção, desencadeando uma onda de protestos por todo o mundo.
Sara Serpa explicou que o trabalho “We Can Change The Country” é uma composição “bastante experimental” em que há “o confronto de várias ideias”, incluindo textos da escritora de ficção científica Octavia Butler (1947-2006), do novelista e ativista James Baldwin (1924-1987) e discursos do Partido Republicano e apoiantes de Donald Trump.
“É uma cacofonia, basicamente representa o que nós estamos a viver e canaliza como é que juntos podemos lidar e (…) encontrar um caminho para nos entendermos todos e vermos que na realidade, estamos todos juntos, não estamos tão separados”, disse.
“É uma coisa bastante experimental. Como o próprio Darius Jones diz, é um protesto, uma manifestação e nós, como artistas, também temos esse papel, de sensibilizar e protestar e usar a nossa arte como forma de protesto”, declarou Sara Serpa.